terça-feira, 13 de setembro de 2005

TÊNIS X FRESCOBOL




Um amigo me mostrou este texto e achei muito interessante a metáfora utilizada por Rubem Alves para falar sobre relacionamentos.

Acho que vale a pena dar uma lida e pensar. Como será que estamos levando nossos relacionamentos? O texto não precisa ser apenas direcionado aos casamentos, mas também aos namoros, amizades, enfim, relacionamentos no contexto geral.


Tênis x Frescobol


Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.

Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: ‘Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: ‘Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?\' Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.’

Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O império dos sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: ‘Eu te amo, eu te amo...’ Barthes advertia: ‘Passada a primeira confissão, ‘eu te amo\' não quer dizer mais nada.’ É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: ‘Erótica é a alma.’

O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada - palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.

O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra - pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir... E o que errou pede desculpas; e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...

A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá...

Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Camus anotava no seu diário pequenos fragmentos para os livros que pretendia escrever. Um deles, que se encontra nos Primeiros cadernos, é sobre este jogo de tênis:
‘Cena: o marido, a mulher, a galeria. O primeiro tem valor e gosta de brilhar. A segunda guarda silêncio, mas, com pequenas frases secas, destrói todos os propósitos do caro esposo. Desta forma marca constantemente a sua superioridade. O outro domina-se, mas sofre uma humilhação e é assim que nasce o ódio. Exemplo: com um sorriso: ‘Não se faça mais estúpido do que é, meu amigo\'. A galeria torce e sorri pouco à vontade. Ele cora, aproxima-se dela, beija-lhe a mão suspirando: ‘Tens razão, minha querida\'. A situação está salva e o ódio vai aumentando.’

Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão... O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.

Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor... Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...

Rubem Alves




Bom, em matéria de relacionamento, acredito que o frescobol é bem melhor.

5 comentários:

Anônimo disse...

Oi Ana,nossa, como esse texto diz a realidade de um casamento.Acho até que deveria mudar o nome casamento para tênis...rs
Infelizmente existem raríssimos casamentos " frescobol " ,pois qd casamos temos o pensamento de que vai ser para sempre, eterno,ficar velhinhos juntos, filhos, netos...
Muito bacana seu blogger,até mais.
Roberta

Anônimo disse...

Oi, prima!

Achei muito interessante este texto e me identifiquei bastante com ele. Olha, sempre que posso dou uma passadinha aqui pelo seu blog para ler e me atualizar, gosto muito dos seus textos. De resto, fica a saudade e a vontade de tê-la de volta, aqui por perto, na cidade maravilhosa. Quem sabe tu não volta, né?

Do teu primo querido, JULIANO BARBOSA - RJ

Anônimo disse...

Infelizmente quando entramos em um relacionamento sempre esperamos que o outro nos faça feliz, mas nunca entramos dispostos a "fazer feliz". Sempre queremos saber o q a outra parte tem para oferecer. Casamento é doação, anulação, dedicação. Cumplicidade. Se não confio na pessoa que está ao meu lado, como posso esperar que ela me faça feliz???
Viver a dois não é fácil, mas também não é tão difícil assim, desde que estejamos dispostos a assumir a responsabilidade pelos nossos atos e não vivermos nos justificando sempre que erramos.
Pessoas egocêntricas, egoístas, desonestas, mascaradas, descompromissadas com a verdade, jamais conseguirão fazer alguém feliz. Por serem assim , entram na vida das pessoas e só causam destruição. Destroem sonhos, alegrias, tentam anular nossa identidade verdadeira. É fácil detectar este tipo. Mas, às vezes, por uma simples carência, nos deixamos levar... até que nossas forças se vão, nosso brilho se apaga... e se não tomamos uma decisão radical, nos tornamos mortos vivos.

Anônimo disse...

Olá Paula.
Eterna Mami que maravilha.

Realmente estou em dívida contigo, nunca mais entrei no msn e nem falei mais com o pessoal. Estou trabalhando numa sub sede da empresa onde não tenho acesso ao msn. Agora estou fazendo alguns shows com outros músicos entre outras atividades,estou praticamente indo pra casa só pra dormir mesmo..faculdade, filmagens ..estou do avesso total.

Mas nada justifica o meu esqueçimento, desculpas não aliviam a situação, mas vou continuar me esforçando pra que isso não aconteça todas as vezes que tiver com agenda cheia.

Muito obrigado mami por escrever
um super beijo e boa sorte pra você também.

Filhão Lu

Anônimo disse...

Olá Aninha, belo texto como sempre, verdade, porém felicidade está no sorriso do outro e no complemento de ambos...reciprocidade de sentimentos e não esperar que o outro nos faça feliz, como sendo o dever... estou de volta ao mundo blogueiro..rs... vcs vão ter q me engolir... beijinhos e parabéns pelo blog.. um ótimo fds..
Aninha Bubu
http://bubu.zip.net